quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Moinhos

Em Albergaria-a-Velha há uma rota que o leva a descobrir 14 moinhos

Construíram-nos nas margens dos rios, ribeiros e regatos; desviaram as águas para que embatessem furiosamente nos rodízios de madeira; os grãos que lhes dão a moer fazem as pesadas pedras giratórias ranger sincronizadamente e a farinha que de tudo isto resulta sussurra ao cair das mós. Durante séculos, o moinho foi um dos lugares centrais da vida das comunidades rurais e, em toda a Europa, não há terra que os tenha em tão grande quantidade como o município de Albergaria-a-Velha. Existirão mais de 350 moinhos no concelho!

Com vista à requalificação e proteção destas estruturas, o município de Albergaria-a-Velha, em parceria com associações e instituições locais, criou, em 2014, a Rota dos Moinhos, uma oferta turística que, atualmente, conta já com 11 núcleos (num total de 14 moinhos) espalhados por todas as freguesias. O projeto vai além da salvaguarda do património edificado e da atração de turistas, focando-se na preservação dos saberes, memórias, vivências e tradições dos antigos moleiros, bem como na afirmação da identidade de Albergaria-a-Velha como terra de água, moinhos e pão.

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https://www.aveiromag.pt/2020/07/11/em-albergaria-a-velha-ha-uma-rota-que-o-leva-a-descobrir-14-moinhos/

AVEIROMAG

segunda-feira, 12 de outubro de 2020

Regueifa de canela

Agora que tanto se fala (e ainda bem!) da regueifa de canela de Albergaria, dou aqui público testemunho que a do fabrico do Élio Dinis, do Nobrijo, Branca, de que sou comprador, há mais de dez anos, é excelente.

Sempre a compramos no mercado da Costa Nova, nas manhãs de sábado ou domingo, quando lá vamos, ao peixe. E é a melhor altura de a comprar, para se comer à sobremesa do almoço, quando a sua textura, sabor e aroma estão mais refinados.

Então, é assim.

Quando lá for, não peça “uma” regueifa: peça, sim, “aquela” regueifa. Ou seja, escolha-a primeiro, com o olhar, na bancada. Escolha a que estiver mais cozida, e portanto mais castanha e com muitos “olhos” e mais negros. Depois de indicar “aquela” regueifa, a escolha ainda não está completada: observe a parte de baixo, que também deve estar escura, entre o castanho escuro e a cor de cinza. Daí que o processo possa demorar o seu tempo, mas pode crer que o Élio Dinis ou as meninas que estão no balcão terão a necessária paciência, pois identificarão imediatamente que é um conhecedor do assunto, a quem se deve corresponder com solicitude. De um lado, quem cozinha com arte; do outro, quem sabe o que quer comer. E depois, pode ser que os espanhóis que andam por lá também aprendam alguma coisa.

COM VAGAR

Feita a compra e pago o ridículo preço de 1,25€ pela regueifa, tenha cuidado em não a amassar dentro do saco. Por isso, se entretanto também comprou um saco de suspiros, ou de bolos de gema, ou um folar (ou tudo junto, o que está longe de ser um exagero, pois dá para oferecer aos filhos e aos pais) tenha cuidado para não colocar tudo dentro do saco, a esmo: separe os artigos com cuidado.

Agora, não tenha pressa em começar a comer a regueifa, pois se o fizer arrisca-se a não ter sobremesa. Guarde-a na mala do carro e traga-a direitinha para casa.

Depois dos preliminares prandiais de um almoço de sábado ou domingo, que imagino que sejam mais demorados que o costume, é chegado o momento de atacar a regueifa. Tenha logo em atenção que se trata de um acto comunitário, familiar. O exemplar vem para a mesa, inteiro, e a família ou os amigos estão cerimoniosamente expectantes. O produto merece-o. Vai começar o segundo momento da sua digressão gustativa, pois que o primeiro foi a escolha.

E pergunto eu: sabe como se come a regueifa? Digo-lhe já que há uma regra de oiro: nada de faca! A regueifa não pode ser cortada, mas sim esgaçada, o mais delicadamente possível, com as pontas dos dedos, para não a asfixiar. Cada conviva retira o seu pedaço de regueifa, esgaçando-o na horizontal e coloca-o no seu pratinho. E pode então começar, “descascando”, ou seja, retirando a crosta de cima, pelos “olhos”, que não são mais que bolhas de massa que cozeram e ficaram enfolipadas) e vai comendo. As pequenas hóstias castanhas, quebradiças, são uma delícia! E por isso já percebeu por que a regueifa deve estar bem cozida, pois só assim obterá uma crosta consistente e levemente quebradiça, às vezes crocante.

UMA UNIÃO PARA A VIDA!

Comida a parte cima do seu naco de regueifa, passa à parte de baixo, que é rugosa, estriada. Vai arrancando essas estrias de pão, como se estivesse a desfiar um pedaço de bacalhau – se a crosta foi saborosa, a côdea, comida em lascas, é ainda melhor. Faça por as lascas saírem rapadas, sem miolo, porque este vai a seguir. Na sua mão vai por fim ficar então o que restou do pedaço de regueifa, que é o miolo. E quando o comer, logo perceberá porque lhe recomendei que tivesse cuidado no transporte do artigo e não o amassasse, e também porque lhe disse que não deve usar faca e porque deve “desconstruir” o pedaço de regueifa com cuidado e com critério. É que só assim obterá um miolo esponjoso, dúctil, leve e perfumado. Comer aquele bocado final de regueifa, o miolo, é o culminar de sensações gustativas de eleição, e que só um produto único e de extraordinária qualidade como é a regueifa de Albergaria lhe pode proporcionar.

Já agora, ela vai com qualquer bebida, até mesmo a água. Mas a regueifa com um cálice de Vinho do Porto – é uma união para a vida!

Mário Jorge lemos Pinto / Correio de Albergaria, 28/05/2014

https://arquivo.pt/wayback/20150912105211/http://www.correiodealbergaria.pt/?p=1268