quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

Idosos ajudam na identificação de fotos antigas

Utentes da Misericórdia de Albergaria-a-Velha colaboram com o arquivo municipal para a criação de uma base de dados sobre as famílias locais

Apesar das calças à boca de sino, não há dúvidas. O retrato é de Cristina Pamplona. Mais à frente é Fernando Pinto, que casou com a Kika Chouriças *. Identificámos ainda Lutero Letra da Costa, filho de Venâncio Costa, que casou três vezes e foi pai aos 70 anos de idade.

Para muitos, estes nomes pouco ou nada dizem. Para outros, utentes da Santa Casa da Misericórdia de Albergaria-a-Velha e comunidade local, os retratos que surgem projetados na parede são memórias de vida.

Estamos na Santa Casa da Misericórdia de Albergaria-a-Velha. Hoje é dia de sessão com o arquivo municipal. É assim todos os meses, desde 2018 *. Fruto da doação de 200 mil chapas fotográficas à autarquia, do espólio da mais importante casa de fotografia de Albergaria-a-Velha, Foto Gomes, os utentes e comunidade em geral estão a ajudar no processo de identificação de várias fotografias.

“Uma hora de recordações” confessa o provedor José Luís Marques Mendes, corroborado pelo impulsionador do projeto e vice-presidente da autarquia, Delfim Bismarck. Desde que teve início, já foram projetadas cerca de três mil fotografias. Destas, estima-se que tenham conseguido identificar-se cerca de 500. Um número bastante satisfatório que, em muito, engrandece a história local.

“Estamos a falar de um espólio entre 1930 e 2000. Muitas fotografias não tinham registo”, revela Bismarck, que é também historiador e genealogista. Com esta atividade colaborativa, reconhecida como uma boa prática pela Associação Portuguesa de Bibliotecários, Arquivistas e Documentalistas, o arquivo municipal abre-se à comunidade e à Santa Casa, conseguindo juntar o útil ao agradável.

“Conseguimos um apoio fundamental dos mais idosos na identificação de fotos e, ao mesmo tempo, proporcionamos satisfação e uma viagem no tempo para todos os que participam”, congratula-se o vice-presidente. Para o provedor, “esta atividade tem um cariz especial porque traz aos idosos vivências do passado e das suas vidas”.

O "Voz das Misericórdias" acompanhou uma das últimas sessões. Ainda que não pudéssemos ajudar na identificação, foi fantástico assistir a este regresso ao passado. “O número 5 é o Quim Zé. E a Cristina Pamplona com as calças à boca de sino. É o engenheiro Rui Tavares, tem hoje a mesma cara.

Este é o Toneca, António Ferreira Lopes. Estas foram apenas algumas das afirmações proferidas durante uma hora de sessão. Nalguns casos não se consegue identificar o registo, noutras situações reconhece-se a cara, mas o nome "foge" à memória. Situações curiosas também não faltam. Numa das sessões o retratado estava entre os utentes e foi uma reação maravilhosa. "Eu encontrei uma fotografia da minha sogra quando era muito jovem", conta-nos um dos elementos da mesa administrativa da Santa Casa.

Carmelinda Sequeira é presença assídua nas sessões. Uma ajuda preciosa na identificação. "Conheço muita gente, fui funcionária da Casa Gomes. Sempre que há uma sessão telefonam-me para não faltar". Maria Celeste Castro também não perde uma sessão. "Recordar é viver" diz-nos a sorrir.

O objetivo dessas sessões é ajudar o arquivo municipal no trabalho de inventariação que está a desenvolver sobre as famílias do município e que visa a criação de uma base de dados com informação variada e fotografias para, segundo Delfim Bismarck, apoiar futuros estudos e investigações. Além das sessões de reconhecimento, os técnicos do arquivo a proceder ao cruzamento de vários registos: batismos, casamentos, óbitos, emissão de passaportes, encomendas de fotografias, cartas de condução, entre outros.

Vera Campos, Voz das Misericórdias, Março de 2019

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