quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Gualdino Pimenta

Aos dois anos, uma paralisia infantil deixou-lhe sequelas que perduram até aos dias de hoje. A doença impediu-lhe de ajudar o pai no campo e um dos trabalhos que se adaptava à sua situação era o de alfaiate. Foi através da ajuda da sua segunda mãe que entrou no mundo das agulhas e linhas, com apenas 11 anos.

Foi num domingo, no dia em que o pai fazia anos, que Gualdino Pimenta viu a sua vida tomar um novo rumo. A impossibilidade de trabalhar nas lides do campo com o pai deu lugar à oportunidade de fazer das linhas e agulhas uma profissão.

No dia do aniversário do meu pai, um alfaiate foi entregar um fato novo e houve uma conversa na qual disse que precisava de ajuda e o meu pai autorizou. A minha segunda mãe ajudou muito nesse sentido. O meu grande desejo era estudar, mas não havia condições na altura.

Ao fim de cinco anos de trabalho, decidi ser mesmo alfaiate. Decidi aprender realmente a arte e seguir um caminho mais profissional. Até aí andava na profissão para fugir das vacas, do trabalho no campo, mas sem amor à profissão. Naquela época, os patrões faziam um pouco de pressão sobre os pais e quando disse que ia embora o meu patrão foi fazer as queixinhas do costume ao meu pai, que me tentou demover. Mas nesse momento decidi que eu passaria a comandar a minha vida.

Com 16 anos, depois de ter estado a trabalhar cinco anos de graça, tive o meu primeiro ordenado. Ah, pois é … por isso é que a juventude de hoje não sabe o que é a vida. O meu primeiro ordenado foi dado aos meus pais porque na altura éramos criados para dar o ordenado aos pais e assim foi até três meses antes de casar.

(texto publicado na edição da 1.ª quinzena de Dezembro do jornal Beira Vouga)

A sua carreira teve início na alfaiataria de Manuel Caixeiro, onde permaneceu durante um ano, e onde estava "encarregue dos acabamentos". Depois, foi trabalhar com o alfaiate Manuel Sacristão, durante quatro anos e meio, onde, para além desta profissão "aprendi a ser sacristão e cangalheiro", relembra.

Com 16 anos, tomou a grande decisão de ser alfaiate e começou a trabalhar por conta própria. Aos 24 anos casou-se com Esmer Pimenta, costureira de profissão, que ainda hoje o auxilia no trabalho. "Fui aprendendo continuamente e comecei a evoluir", conta Gualdino Pimenta.

Dos primeiros grandes trabalhos que realizou, destaque para as fardas de gala dos Bombeiros Voluntários de Albergaria-a-Velha.

Há 25 anos, José Maria Marques, na altura presidente da Federação Portuguesa de Folclore convidou-o a confeccionar trajes regionais para o Grupo Etnográfico de Albergaria. "A partir daí, comecei a ser procurado por outros grupos do distrito. Foi uma arte que aprendi nos anos 50, através da visualização do modelo original, reproduzia os trajes que remontavam a 1900, era um trabalho que me dava muito gosto", confessa.

Entretanto, foi contactado por um empresário italiano que encomendou 15 smokings para um evento no Casino Estoril. "Para minha alegria, no dia seguinte à festa veio agradecer e dizer que o meu trabalho tinha sido muito elogiado. O que me levou a ter de fazer mais smokings para outro evento e, inclusive, fui o alfaiate de serviço para um casamento de família", diz sorridente.

Sempre teve clientes nacionais e internacionais e relembra a visita de um empresário francês, "passei a ser o alfaiate dele quando se deslocava a Portugal". A nível nacional, confessa que sempre trabalhou com todas as classes sociais, "desde ministros, médicos, políticos e lavradores". Mas destaca um cliente peculiar, o Dr. José Homem, com as suas famosas "calças de oito bolsos e vincos permanentes, feitos em exclusivo".

Ao longo de toda a carreira foi sendo reconhecido pelo trabalho desenvolvido na alfaiataria de homem, senhora e criança. Mas, Gualdino Pimenta nunca vai esquecer o dia 11 de Outubro de 2004, um dia de festa passado em Paris, França, data em que recebeu o "Prémio de Ouro pela Qualidade", em que foi considerado o melhor alfaiate do mundo. "É uma emoção indescritível. De entre uma selecção feita em 168 países, 85 dos quais presentes (com um alfaiate a representar cada país), eu fui o escolhido", conta visivelmente emocionado.

Em Fevereiro de 2007, foi reconhecido em Frankfurt, Alemanha, com o "Internacional Arch of Europe Award - Platinum Category" mas não esteve no local para receber a distinção.

Casado com a costureira Esmer Pimenta, o casal tem três filhos (dois homens e uma mulher) mas só um deles aprendeu esta arte, "apenas o Zé é um bom profissional de agulha", diz, referindo-se a Licínio Pimenta, vereador da Câmara Municipal de Albergaria-a-Velha.

Gualdino Pimenta tem como sonho escrever um livro com as suas memórias como alfaiate. "Neste momento, estou a reunir fotografias e documentos antigos para mais tarde passar esses momentos para o papel", finaliza.

(texto de Sandra Pinho publicado no jornal Litoral Centro)

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